No princípio, a cozinha era baseada em sete elementos, de acordo com os ensinamentos bíblicos: a cevada, o trigo, a azeitona, o figo, a romã, a tâmara e as ervas. Ao longo dos anos, quando foram expulsos da Palestina, no ano de 135 d.C. (fato conhecido como Diáspora), a culinária sofreu adaptações e deu origem à alimentação de hoje. As danças, músicas e as comidas típicas, como o gelfite fish , kuguel (torta de batata) e faláfel (bolinho de fava e grão-de-bico), marcam as festas judaicas.
Segundo o rabino Dov Ber, do restaurante judaico Kur, em São Paulo, a alimentação dessa comunidade, conhecida como kasher (significa "preparado"), tem como base a Torá, o livro sagrado dos judeus que, de acordo com a história judaica, foi entregue a Moisés, por Deus, no monte Sinai - passagem que conhecemos dos dez mandamentos. "A mesa kasher consiste em diversos preceitos que vão desde como o animal deve ser abatido até seu preparo", explica o rabino
Culinária singular
A principal característica da alimentação está na maneira detalhada de preparar os alimentos. A comida judaica tem como premissa a separação de alimentos fontes de carne e leite, já que eles não podem ser misturados em uma única refeição, uma vez que, consta na Torá "Não cozerás um cabrito no leite de sua mãe" (Êxodos 23:19).
Por exemplo: bife à parmegiana tem carne e queijo, portanto não existe este prato na culinária kasher, a não ser que o bife seja à base de soja. "Isso porque a soja, assim como as frutas, os legumes e algumas verduras, são considerados alimentos neutros (chamados de parve) e que podem ser misturados com qualquer outro tipo de comida", conta a nutricionista Weruska Barrios, do Hospital Samaritano, de São Paulo.
Para que a escolha e a separação desses alimentos sejam feitas da maneira correta, a cozinha kasher é separada, ou seja, a estrutura e os utensílios que cozinham os alimentos de carne não podem ser usados para preparar alimentos à base de leite.
Higiene especial
A religião proíbe o consumo de insetos, vivos ou mortos. Por isso, as verduras, frutas e hortaliças devem ser minuciosamente examinadas. Normalmente, as folhas, como agrião, rúcula, repolho, brócoli e couve-flor, não fazem parte da dieta habitual dos judeus que moram no Brasil - em Israel, tudo é permitido, pois há uma fiscalização rigorosa no controle de pragas e vermes nas plantações desses alimentos - porque são de difícil higiene e podem conter pragas e, assim, prejudicar a pessoa que irá consumir.
A mesma cautela também se aplica aos laticínios, que são preparados perante a supervisão de um judeu religioso chamado de mashguiach (significa "o que observa"). Ele é responsável por fiscalizar e não deixar que os alimentos não considerados kasher sejam misturados nas refeições.
Carnes brancas
Além da carne de boi, as carnes brancas também são permitidas, mas com restrições. Em relação aos peixes, a lei judaica indica: "Podereis comer de tudo o que vive nas águas, seja nos mares ou nos rios, desde que tenha nadadeiras e escamas" (Vayicra Xl:9). Já quando se trata de aves, apenas não é permitido utilizar água quente para retirar as penas. "Peixes não precisam ser preparados de acordo com as normas da cozinha judaica, pois eles possuem uma quantidade mínima de sangue, portanto, a afirmação bíblica sobre a proibição de ingerir sangue está limitada a mamíferos e aves", esclarece a nutricionista.
Outras tradições
Entre as bebidas, o vinho e o suco de uva representam a santidade do povo judeu e sempre estão presentes nas comemorações judaicas. "Qualquer subproduto que contenha as bebidas, como vinagre de vinho, bala, geleia, refrigerante de uva, conhaque e outras bebidas que possam ser destiladas ou misturadas com vinho, só poderão ser ingeridas quando possuírem supervisão rabínica confiável", indica o rabino do Restaurante Nur, de São Paulo.
Contudo, a culinária judaica é considerada bastante saudável, já que prioriza alimentos nutritivos e higienização eficiente. "Hoje em dia, a procura dos não judeus por este tipo de produto tem aumentado, justamente por toda essa preocupação com a cadeia produtiva do alimento", enfatiza a nutricionista do Hospital Samaritano.
Qualquer pessoa pode se deliciar com as receitas dessa cozinha, já que os alimentos kasher não possuem restrições. Exceto quando a pessoa tem intolerância a algum tipo de alimento. Mas o preço é um pouco salgado aqui no Brasil. "Os alimentos kasher têm um custo mais elevado do que os tradicionais", informa Weruska. Curiosidade: em Israel e nos Estados Unidos, os preços são comuns, pois a regra de produção e massa mantém os valores normais de mercado.
Os costumes para o preparo
As tradições da culinária judaica começam nos cuidados com o animal cuja carne será servida. O abate, conhecido por eles como shechita (lê-se she-rri-ta), é feito com muita precisão e cuidado para evitar o sofrimento do animal. "Após o abate, a carne passa por um processo em que é retirado seu sangue, uma vez que não o comemos por representar a morte", conta o rabino Dov Ber, do restaurante Kur, em São Paulo. Além disso, ainda existe uma restrição dos animais permitidos: tem de ser ruminante e ter a pata fendiada, como no caso do boi, que possui as duas exigências.
Curiosidades
Em restaurantes kasher, a supervisão de um rabino é fundamental para que todo o processo de preparo e higienização dos alimentos tenha credibilidade perante a comunidade judaica.
Cada rabino tem um selo de garantia - chamado hashgacha (significa "supervisão") - que indica rigorosa supervisão de todos os processos de produção dos alimentos.
Além do cuidado na seleção e no preparo dos condimentos, as normas kasher definem também o tipo de ração e abate do animal.